Algumas histórias começam com o clássico “Era uma vez”. Outras com a descrição do personagem principal ou do lugar dos acontecimentos. Mas essa é diferente. Ela começa com algumas perguntas:
E se a gente transformasse a vida de quem não teve a oportunidade de aprender a ler e a escrever?
E se a gente pudesse contar com o apoio profissional de uma pessoa com formação em pedagogia para trabalhar a alfabetização da forma correta?
E se a gente vendesse papelão que a empresa junta para conseguir recursos e remunerar alguém que possa nos ensinar a ensinar?
E se nossos alunos e alunas já souberem ler e estiverem prontos para os próximos passos?
E se a gente colocasse tudo isso em prática?
Foi assim, com muitas perguntas e poucas respostas, que nasceu o +SABER, iniciativa do Comitê de Voluntariado da Algar Telecom de Uberlândia. O objetivo é oferecer aulas de alfabetização para pessoas adultas que querem aprender a ler e escrever.

As atividades começaram em abril de 2023. As aulas acontecem na estrutura da Casa Assistencial Pai Joaquim de Angola (Capaja), no bairro São Jorge, em Uberlândia. A organização cedeu uma sala para que estudantes, professora e voluntários pudessem se encontrar duas vezes por semana, para as aulas de alfabetização.
Com pouco mais de um ano e 13 alunos e alunas fixos, o +SABER foi reconhecido em 2024 com o Prêmio Alexandrino Garcia, concedido pelo Instituto Algar para as iniciativas de voluntariado que transformam a vida das pessoas.
O primeiro “e se...?”
Fernando Costa trabalha na Algar Telecom, na área de marketing e novos produtos. Está na empresa há 12 anos. Há dez, atua como líder social. Rose Gonçalves trabalha na Diretoria Financeira. Tem mais de dez anos na Algar Telecom e é voluntária no Programa de Voluntariado do Instituto Algar.
Do encontro deles, vieram os primeiros questionamentos: “e se...?”
A história começou em um fim de semana, quando Rose foi comprar plantas na casa de uma senhora. A responsável era a Dona Divina. Na hora de receber, ela só aceitava dinheiro. Nada de cartão, nada de pix. Rose ficou brava, reclamou, deu até uma bronca na vendedora. Foi quando a neta da mulher chegou perto e disse que a avó não sabia ler nem escrever.
Rose, movida pelo espírito de servir, se ofereceu para ensinar Dona Divina a usar a máquina de cartão. Ela conhecia os números, faltava conhecer as letras e como elas se juntavam em palavras e frases.
“No nosso primeiro encontro de aprendizagem, ela falou: é muito ruim olhar as letras e não sabe ler, né? Ali, naquele momento, nasceu a ideia do +SABER” Rose Gonçalves
Para que as aulas com Dona Divina pudessem evoluir corretamente, Rose buscou uma pedagoga, que orientava os conteúdos. Os encontros eram semanais, a experiência era compartilhada com os colegas voluntários. A partir daí, tomaram a decisão de ampliar as aulas para mais gente interessada.
Era hora de mais uma pergunta.
“E se a gente oferecesse aulas para mais gente?”
Com os bons resultados da Dona Divina, Rose, Fernando e os demais voluntários amadureceram a ideia de oferecer aulas de alfabetização para adultos. Eles não tinham dinheiro, nem local, nem professor. Não sabiam dar aulas. Mas tinham a vontade de tentar, de avançar para uma próxima etapa.
Buscaram apoio no Instituto Algar e de uma ONG onde as aulas pudessem ser realizadas. A parceria foi estabelecida com a Casa Assistencial Pai Joaquim de Angola (Capaja), no bairro São Jorge, em Uberlândia, que cedeu o espaço gratuitamente.

Na Algar Telecom, começaram a se mobilizar para descobrir se havia algum voluntário ou voluntária com experiência em pedagogia. E se tivesse alguém, né? Já ajudaria bastante. Mas não tinha. Resolveram então contratar uma pedagoga, a mesma que ajudava a Rose nas aulas para a Dona Divina.
Para remunerar a professora, tiveram autorização para vender os papelões descartados pela Algar Telecom. O dinheiro foi suficiente para manter as aulas ao longo de 2023. Os encontros aconteciam às segundas e aos sábados, com a presença dos voluntários.
Com os resultados, o +SABER teve continuidade e em 2024 passou a contar com o apoio financeiro do Instituto Algar, para manter a professora, já habituada à turma.
E se... a gente incentivasse uma aluna a ir mais longe?

Atualmente, o +SABER tem 13 alunos e alunas participantes. A mais jovem tem 23 anos. O mais velho já passou dos 65. Para Rose e Fernando, as pessoas são bem diversas. Tem quem chega e já aprendeu alguma coisa. Tem quem frequentou a escola. Tem quem vai para manter a cabeça ativa. E tem a Edilene Rufino dos Santos, que se tornou embaixadora do projeto.
Ela nunca frequentou a escola em seus mais de 40 anos de vida. Passou pelo +SABER, ingressou no programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA) da rede estadual de ensino e hoje já concluiu a primeira etapa do ensino fundamental. Sabe ler e escrever bonitinho, como ela mesma diz!
Edilene não estudou quando era criança. Não havia escola na roça e o trabalho começava cedo. Com oito anos já ajudava a família. Na adolescência e começo da vida adulta, o trabalho consumia todo o tempo e a possibilidade de ir para a escola era inexistente. Mudou-se para São Paulo aos 17 anos, para tentar a vida na cidade grande. Casou-se, teve filhos. Eles foram para a escola, ela não. Mas sempre tinha aquela vontade de estudar.
Em 2001 voltou para Uberlândia. Uma vida de trabalho dentro e fora de casa. Todos os filhos tiveram a oportunidade de estudar e ter uma profissão. Edilene ainda sonhava com a escola, mas agora achava que seu tempo tinha passado. Até que conheceu o trabalho do +SABER, na ONG Capaja. Todos os sábados, ela levava o filho mais novo para atividades de reforço escolar. Enquanto esperava, passava pela sala de alfabetização de adultos.
E se eu superasse a vergonha de não saber ler?
No começo, Edilene tinha vontade de entrar, mas não entrava, com vergonha de ser adulta e não saber ler ou escrever. Um dia tomou coragem! Foi recebida pela professora, pelos colegas, ganhou caderno e o convite para ficar e assistir às aulas. Não parou mais. Aprendeu rápido e se desenvolveu bastante.
“Eu mal sabia escrever meu nome. Quando ia no posto de saúde e as pessoas pediam para eu preencher uma ficha, tinha que dizer que não sabia escrever. Era muito triste. Hoje já escrevo, leio e sei que posso aprender muito mais”. Edilene dos Santos
O aprendizado não parou aí. Ao perceber seu desenvolvimento, os voluntários da Algar e a professora queriam que ela seguisse adiante. Buscaram um programa de Educação de Jovens e Adultos (EJA), Edilene fez uma prova e conseguiu iniciar os estudos em uma escola formal. Sabem qual o sonho dela? Se tornar advogada. Potencial e força de vontade ela tem de sobra!
Atualmente, Edilene atua com voluntária no +SABER, ajuda outros alunos e alunas. Um deles, é seu marido, que ela arrastou para as aulas. Ele já melhorou as habilidades de escrita e leitura e disse que só sai de lá depois que aprender direitinho. Para ganha a vida, ela faz pequenos fretes e vende perfumes. É também voluntária, ajudando a Capaja nos fretes que a instituição precisa.
Transformar pela educação
Os voluntários do Comitê da Algar Telecom querem seguir com o projeto até que o último aluno tenha aprendido a ler e escrever. O caso de sucesso da Edilene motiva todas as pessoas que participam.
Para ela, nunca é tarde para aprender. “No começo, eu não queria porque achava que estava velha, tinha vergonha. Hoje, quando converso com pessoas na mesma situação que a minha, aconselho. Nunca é tarde. No começo a gente vai estranhar, achar difícil, é preciso ter coragem. Mas vale muito a pena. Transformou a minha vida”, conta.
Rose e Fernando consideram a experiência com o +SABER como um ponto importante em suas jornadas como voluntários e membros do Comitê de Voluntariado da Algar.
“A gente não sabia fazer nada daquilo que a gente fez. Um segurou na mão do outro e falou: vamos fazer juntos, vamos descobrir, buscar as respostas. Existem pessoas que querem fazer diferença na sociedade e essa foi a maneira que a gente encontrou”. Fernando Costa
E foi assim, de um “e se...” para o outro, que os voluntários e voluntárias da Algar Telecom contribuíram para que um grupo de adultos tivesse acesso ao mundo das palavras, da cidadania de poder preencher um formulário, do orgulho de entrar em uma sala de aula pela primeira vez na vida!
Mereceram, e muito, a conquista do Prêmio Alexandrino Garcia. O comendador ficaria orgulhoso de ver que o legado que quis deixar é colocado em prática pelos associados do Grupo: ser “gente servindo gente”!
Komentar